segunda-feira, 21 de julho de 2008

A Escada Não Me Interessa


Em 1930, Wittgenstein disse uma coisa muito curiosa:
"Aquilo que se alcança por uma escada não me interessa."
(CV, edição revisada [1998], p. 10)


Mas havia interessado doze anos antes. Na § 6.54 do Tractatus lê-se:
"Minhas proposições elucidam dessa maneira: quem me entende acaba por reconhecê-las como absurdos, após ter escalado através delas – sobre elas – para cima delas (Deve-se jogar fora a escada, por assim dizer, após ter subido por ela.)"

O que mudou, senão o fato de que o que Wittgenstein buscava não estava lá no alto, mas aqui mesmo, ao lado? Em vez da linguagem sublime, o sublime da linguagem.

A escada do Tractatus havia sido um artefato retórico utilizado para seduzir o leitor a vir para cima, para os valores absolutos, para o sentido da vida, a ética, a felicidade, a face externa da fronteira do mundo sobre a qual nada se pode dizer, porque está fora do mundo. Em outras palavras, se nenhum fato, dentro do mundo, porta valores, se os fatos são indiferentes à vontade, se participam da formulação dos problemas, mas não resolvem os problemas, que é como se deve viver, então o sentido da vida não tem fundamento, só pode ser "sentido". Que o mundo exista é independente do que existe no mundo. Por isso, quando se sabe que o que se sente é o que vale a pena, os problemas filosóficos acabam, são como que implodidos por dentro, e a escada pode ser jogada fora. Viver nada tem a ver com filosofia.

Mas veja, essa metafísica só é possível sobre a base de que só há uma linguagem, a que representa o mundo, por um lado, e mostra, por outro, o que não pode ser dito. Uma vez que a forma lógica, que garante a correspondência necessária à representabilidade da linguagem, não se aplica aos fenômenos concretos, uma vez que essa condição necessária da representabilidade não é uma forma lógica, mas como que se gera de muitas e variadas maneiras na própria prática da linguagem, então para que a sedutora escada? Não há nada excelso nem sublime na linguagem.

A questão dos valores, da ética, está na própria vida, não lá em cima.

Todo um programa de investigações filosóficas se retoma nessa época, e acompanha Wittgenstein, sem escadas, até o fim da sua vida.

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